domingo, 21 de agosto de 2011

Competências e habilidades: Elementos para uma reflexão pedagógica[1]

Competências e habilidades: Elementos para uma reflexão pedagógica[1]
Lino de Macedo

Em textos sobre Educação é freqüente, hoje, o uso dos termos “competências e habilidades”. Por isso, o propósito aqui será analisar, na primeira parte, algumas razões para a importância atual dessas noções e oferecer, quem sabe, elementos para uma reflexão pedagógica sobre o significado de considerarmos a educação na perspectiva desses dois domínios.

Por que competências e habilidades, hoje?
O direito de todas as crianças percorrerem os ciclos que compõem a escola fundamental é uma conquista recente e importante. Está expresso, por exemplo, na Declaração dos Direitos Humanos (1948), no Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), em nossa atual Constituição Brasileira (1988) e, mais recentemente, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996).
Com isso, pretende-se que a escola seja para todos e que nela as crianças possam formar valores, normas e atitudes favoráveis à sua cidadania e dominarem competências e habilidades para o mundo do trabalho e da vida social, nos termos em que hoje se expressam.
Nem sempre a escola foi aberta para todos. Tínhamos antes, como ainda temos agora, uma escola da excelência que seleciona, orienta, ensina e certifica apenas as pessoas que conseguem realizar tarefas e que apresentam uma conduta condizente com o alto nível exigido por elas. Mas a realidade nos diz que na escola da excelência poucas crianças têm condições de entrar, menos ainda de permanecerem nela ou de serem bem-sucedidas nas muitas provas e desafios que terão que enfrentar.
Na escola para todos, por definição, as qualidades selecionadas e valorizadas na escola da excelência são referências ou qualidades desejadas, mas não definem o ponto de partida, nem a condição para a realização do percurso.
Na escola da excelência, competências e habilidades, nos termos em que analisaremos mais adiante, são meios para outros fins: a erudição, o aperfeiçoamento, o domínio das matérias ou disciplinas, a realização de metas ou trabalhos de ponta. Na escola para todos, competências e habilidades são o próprio fim e, nela, as matérias ou atividades escolares são os meios que possibilitam sua realização.

Exercício ou problema?
Aproveitemos a situação para uma reflexão sobre a diferença entre exercício e problema. O exercício supõe a repetição de uma aquisição – motora, no caso – de uma habilidade que, para aquele que a executa, não constitui um problema. Problema é aquilo que se enfrenta e cuja solução, já conhecida ou incorporada, não é suficiente, ao menos como conteúdo. Explico: há problemas que nos desafiam não pela forma, porque essa já é conhecida, mas pelo seu conteúdo, que é novo, inusitado, singular, original.
Em síntese, exercício é o repetir, como meio para uma outra finalidade: por exemplo, caminhar para promover um trabalho cardiovascular. Problema é o que surpreende nesse exercício, é o novo, o que supõe invenção, criatividade, astúcia. É certo, também, que, dependendo da forma como é proposto, o exercício pode configurar um problema.
Seria, então, possível perguntar se as questões são formas de exercício ou de problema. Certas questões sugerem bons problemas, outras não. O importante é que a questão faça gerar um desejo ou uma necessidade que só o trabalho de encontrar uma solução possa satisfazer. É fundamental, ainda, que a questão proponha um desafio que possa proporcionar ao sujeito que o experimenta algo no mínimo original, criativo ou surpreendente. Convenhamos, na escola nem sempre sabemos fazer isso.
Um problema supõe um projeto mais complexo, que envolve interpretação da questão proposta, planejamento, execução e avaliação. Envolve também atenção, malícia, espírito crítico e reflexão.

Competências e Habilidades
Por que decidi, em um texto sobre competências e habilidades, iniciar comentando sobre solução de problemas? Para responder a essa questão talvez valha a pena mais uma pequena digressão.
Até pouco tempo, a grande questão escolar era a aprendizagem – exclusiva ou preferencial – de conceitos. Hoje, essa forma de competência continua sendo valorizada, principalmente, no meio universitário. Mas, com todas as transformações tecnológicas, sociais e culturais, uma questão prática, relacional, começa a impor-se com grande evidência. Temos muitos problemas a resolver, muitas decisões a tomar, muitos procedimentos a aprender. Isso não significa, obviamente, que dominar conceitos deixou de ser importante. Esse tipo de aula, insisto, continua tendo um lugar, mas cada vez mais torna-se necessário também o domínio de um conteúdo chamado de “procedimental”, ou seja, da ordem do “saber como fazer”.

As três formas de competência
Passemos agora ao objetivo principal desse texto: fornecer elementos para uma reflexão pedagógica sobre significados de “competências e habilidades”.
Proponho que competência seja entendida de três modos, muito interessantes e comuns.
Competência como condição prévia do sujeito, herdada ou adquirida. Essa primeira forma de competência não significa apenas formas de aquisição, mas também pode se referir a uma perda - permanente ou transitória - de competência.
Competência como condição do objeto, independente do sujeito que o utiliza. Na escola, essa forma de competência está presente, por exemplo, quando julgamos um professor pela ‘competência’ do livro que adota, da escola em que leciona, do bairro onde mora.
Competência relacional. Essa terceira forma de competência é interdependente, ou seja, não basta ser muito entendido em uma matéria, não basta possuir objetos potentes e adequados, pois o importante aqui é “como esses fatores interagem”. A competência relacional expressa esse jogo de interações.
As três formas de competência, acima descritas, na prática não se anulam necessariamente, pois se referem a dimensões diferentes e complementares de uma mesma realidade.

Competência e habilidade
A diferença entre competência e habilidade, em uma primeira aproximação, depende do recorte. Resolver problemas, por exemplo, é uma competência que supõe o domínio de várias habilidades. Calcular, ler, interpretar, tomar decisões, responder por escrito, etc., são exemplos de habilidades requeridas para a solução de problemas de aritmética. Mas, se saímos do contexto de problema e se consideramos a complexidade envolvida no desenvolvimento de cada uma dessas habilidades, podemos valorizá-las como competências que, por sua vez, requerem outras tantas habilidades.
Para dizer de um outro modo, a competência é uma habilidade de ordem geral, enquanto a habilidade é uma competência de ordem particular, específica.
Na visão relacional de competência aqui proposta, se os alunos não aprenderam é porque o professor não ensinou, independentemente de sua competência pessoal no domínio dos conteúdos e do valor, de verdade, de sua exposição.

Competição, competência e concorrência
Como analisar os termos competência, competição e concorrência, em uma perspectiva relacional?
Competição. Competir quer dizer “com-petir”, isto é, “pedir junto”. O prefixo “com” significa ao mesmo tempo, simultaneamente. O radical “petir” significa pedir. Numa sala de aula, por exemplo, alunos, diretora, orientadora, horário, agenda de trabalho referem-se às múltiplas tarefas de que a professora deve cuidar – de preferência, ao mesmo tempo. Então, ao que dar prioridade; que decisões tomar?
Concorrência. Concorrer quer dizer correr junto “dirigir-se para o mesmo ponto”. Como cuidar, “simultaneamente”, (porque tudo é importante, esperado, desejado) da vida pessoal, profissional, familiar, etc.? Ou seja, em termos de concorrência, não se trata de optar ou conquistar um aspecto em detrimento de outros (como ocorre na situação de competição), mas de responder adequadamente à multiplicidade das tarefas, de atender a tudo, pois tudo tem de ser atendido. É o caso, por exemplo, da situação de sala de aula.
Competência. Como coordenar competição com concorrência? Com competência. Competência, em sua perspectiva relacional, é uma equação que expressa o equilíbrio entre dois opostos complementares. A competição como fim buscado (necessidade), e a concorrência como repertório (disponibilidade) de coisas independentes quanto a um fim particular, mas que, na perspectiva do sujeito, qualificam os meios de certa realização.
Competência é a qualidade relacional de coordenar a multiplicidade (concorrência) à unicidade (competição).

Aprendizagem significativa e competência relacional
Outro termo presente nas orientações didáticas é a “aprendizagem significativa”.
A aprendizagem significativa instaura novamente na escola uma condição fundamental de nossa busca de conhecimento. Essa condição é a do desejo, ou seja, do conhecimento como necessidade, algo que “falta ser”, que ainda não é nos termos pretendidos ou aceitos pelo sujeito.
A aprendizagem significativa supõe que se encontre “eco” no sujeito a quem é proposta. Daí sua vinculação com uma forma relacional de competência.










A situação-problema como avaliação e como aprendizagem[2]
Lino de Macedo

Mobilizar recursos
Uma das características importantes da noção de competência, segundo Perrenoud, é desafiar o sujeito a mobilizar os recursos no contexto de situação-problema para tomar decisões favoráveis ao seu objetivo ou metas.
Uma situação-problema, em um contexto de avaliação, define-se por uma questão que coloca um problema, ou seja, faz uma pergunta e oferece alternativas, das quais apenas uma corresponde ao que é certo quanto ao que foi enunciado. Os indicadores correspondem, portanto, ao conjunto de sinais, marcas, informações, aspectos destacáveis no texto do enunciado e, igualmente, ao conjunto de pensamentos, idéias, representações, lembranças, raciocínios, sentimentos, etc. do sujeito que está respondendo à questão. Esses indicadores relativos ao objeto, que o sujeito pode observar, e os indicadores relativos ao próprio sujeito, juntos, produzem os elementos, cujo julgamento permitirá a tomada de decisão sobre o que está sendo perguntado e as alternativas disponíveis, das quais apenas uma delas é a correta.
Inferência é o que possibilita a conclusão ou tomada de decisão, em um contexto de julgamentos, raciocínios, interpretação de informações, em favor de uma das alternativas propostas.
Uma boa questão deve propor um percurso entre uma situação de partida, que corresponde à proposição do enunciado, até um ponto de chegada, que corresponde à escolha da alternativa, suposta pelo avaliado, como a que melhor representa a resposta correta.
As situações-problema propõem uma tarefa para a qual o sujeito deve mobilizar seus recursos ou esquemas e tomar decisões.
A competência mais importante para nós é, sem dúvida, a relacional, até porque ela expressa a dimensão indissociável e interdependente das competências relativas ao sujeito e ao objeto. Relacional em suas três versões ou possibilidades de expressão. Há uma relação interpessoal que solicita o desenvolvimento de competências transversais muito importantes. A segunda forma de competência relacional é a relativa aos objetos. Temos destruído a natureza, intoxicado os rios, a atmosfera, depredado bens públicos, maltratado nossos corpos e abandonado regras e princípios que a humanidade e a natureza levaram séculos e séculos para construírem. A terceira forma de competência relacional diz respeito às tarefas ou ao trabalho humano diante das pessoas e dos objetos.
Essas considerações são importantes porque se pode fazer uma questão na perspectiva do modo como as máquinas funcionam e não no modo como as pessoas funcionam ou que se espera que elas funcionem. Por isso, para avaliar se uma situação-problema é boa ou não, temos que julgar se a questão pede solução de problemas, na perspectiva das pessoas ou das máquinas.
ma boa situação-problema, como técnica de avaliação e como concepção de aprendizagem, portanto, deve compor um sistema, ao mesmo tempo, fechado (como um ciclo) e aberto. Fechado como ciclo no sentido de que convida o aluno a percorrer o seguinte percurso no contexto de cada questão: 1) alteração, 2) perturbação, 3) regulação e 4) tomada de decisão (ou formas de compensação). Aberto, no sentido de que propõe trocas ou elementos de reflexão que transcendem os limites da prova e ilustram, ainda que como fragmentos ou lampejos, algo que será sempre maior e mais importante do que as circunstâncias de uma prova, com todos os seus limites e com toda a precariedade de sua realização.

Alteração
A situação-problema,por seu enunciado, cria um contexto que formula uma alteração a ser examinada pelo aluno. Por ser artificial, a situação-problema simula, recorre, inventa ou cria contextos que favorecem a avaliação ou o julgamento de uma dada questão.
Diante de uma alteração, mesmo que artificialmente produzida, podemos ter duas classes de reações. Uma delas expressa-se pela indiferença ou divagação (que impede a compreensão do problema como problema). A segunda classe de reação a uma alteração refere-se à perturbação ou solução ou neutralização do que foi alterado. No contexto de nossas considerações, só interessa a situação-problema que produz uma alteração e que convida o sujeito a reagir ou agir em face da alteração.

Perturbação
Uma perturbação expressa o fato de que uma alteração foi assimilada como um problema, pois, caso contrário, seria suficiente dar a resposta. A perturbação produz um desequilíbrio, rompe com a harmonia do que o sujeito sabia ou pensava sobre um determinado assunto.
Os graus de perturbação oscilam entre um máximo e um mínimo.
Uma boa situação-problema representa, por seu enunciado, a criação de uma perturbação, que altera algo no sujeito e que possibilita, ao propor o conjunto das alternativas, a oportunidade de fechamento do ciclo aberto pelo enunciado.
O que fazemos diante de uma perturbação? A primeira reação refere-se a uma forma negativa de reação. O sujeito desiste, irrita-se, sente-se desqualificado para coordenar as informações ou para aproveitar os indicadores ou dicas oferecidas tanto no enunciado quanto nas alternativas de respostas. Ou seja, a perturbação não gera um trabalho de conhecimento, nem a busca de uma melhor solução. Na segunda classe de reação à perturbação, observamos um trabalho de regulação. Uma boa avaliação deve conter questões ou problemas que mobilizem esse tipo de reação às perturbações. Ou seja, as alternativas apresentadas, em princípio, expressam diferentes soluções ou modos de se compensar uma perturbação, sendo apenas uma delas a que se configura como a melhor solução, nos termos da situação-problema ou tarefa.

Regulação
Regulação é o que fazemos para recuperar o equilíbrio rompido pela pergunta ou problema proposto. Escolher, pelo trabalho da reflexão e de tomada de decisão, a melhor alternativa para uma questão significa realizar uma compensação perfeita, pois recupera o ciclo rompido pela perturbação provocada pela questão.

Como sabemos, a prova é elaborada em um contexto em que os itens são montados em um formato de múltipla escolha. O enunciado identifica o problema. Há uma lista de cinco alternativas, das quais apenas uma é correta (distratora). Nesse sentido, eu diria que das cinco alternativas de resposta algumas têm relação apenas “contingencial” ao enunciado. Contingencial, pois, ainda que as respostas possam, em si mesmas, ser verdadeiras, não se aplicam ao contexto do problema, como formulado em seu enunciado. Portanto, as respostas têm, nesse caso, uma relação aleatória com o enunciado, tal como proposto. Outras respostas são “possíveis, mas não suficientes”, ou seja, propõem como solução algo que não preenche todas as necessidades que permitem eliminar o problema (resolução).
Por isso, há apenas uma única resposta “possível, necessária e suficiente”, pois é a única que integra, que compensa, ou equilibra a perturbação criada com a proposição.


[1] INEP. ENEM: Fundamentação Teórico-Metodológica. Brasília: O Instituto, 2005.
[2] INEP. ENEM: Fundamentação Teórico-Metodológica. Brasília: O Instituto, 2005.

Competências e Habilidades - Lino Macedo

Competências e habilidades: Elementos para uma reflexão pedagógica[1]
Lino de Macedo

Em textos sobre Educação é freqüente, hoje, o uso dos termos “competências e habilidades”. Por isso, o propósito aqui será analisar, na primeira parte, algumas razões para a importância atual dessas noções e oferecer, quem sabe, elementos para uma reflexão pedagógica sobre o significado de considerarmos a educação na perspectiva desses dois domínios.

Por que competências e habilidades, hoje?
O direito de todas as crianças percorrerem os ciclos que compõem a escola fundamental é uma conquista recente e importante. Está expresso, por exemplo, na Declaração dos Direitos Humanos (1948), no Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), em nossa atual Constituição Brasileira (1988) e, mais recentemente, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996).
Com isso, pretende-se que a escola seja para todos e que nela as crianças possam formar valores, normas e atitudes favoráveis à sua cidadania e dominarem competências e habilidades para o mundo do trabalho e da vida social, nos termos em que hoje se expressam.
Nem sempre a escola foi aberta para todos. Tínhamos antes, como ainda temos agora, uma escola da excelência que seleciona, orienta, ensina e certifica apenas as pessoas que conseguem realizar tarefas e que apresentam uma conduta condizente com o alto nível exigido por elas. Mas a realidade nos diz que na escola da excelência poucas crianças têm condições de entrar, menos ainda de permanecerem nela ou de serem bem-sucedidas nas muitas provas e desafios que terão que enfrentar.
Na escola para todos, por definição, as qualidades selecionadas e valorizadas na escola da excelência são referências ou qualidades desejadas, mas não definem o ponto de partida, nem a condição para a realização do percurso.
Na escola da excelência, competências e habilidades, nos termos em que analisaremos mais adiante, são meios para outros fins: a erudição, o aperfeiçoamento, o domínio das matérias ou disciplinas, a realização de metas ou trabalhos de ponta. Na escola para todos, competências e habilidades são o próprio fim e, nela, as matérias ou atividades escolares são os meios que possibilitam sua realização.

Exercício ou problema?
Aproveitemos a situação para uma reflexão sobre a diferença entre exercício e problema. O exercício supõe a repetição de uma aquisição – motora, no caso – de uma habilidade que, para aquele que a executa, não constitui um problema. Problema é aquilo que se enfrenta e cuja solução, já conhecida ou incorporada, não é suficiente, ao menos como conteúdo. Explico: há problemas que nos desafiam não pela forma, porque essa já é conhecida, mas pelo seu conteúdo, que é novo, inusitado, singular, original.
Em síntese, exercício é o repetir, como meio para uma outra finalidade: por exemplo, caminhar para promover um trabalho cardiovascular. Problema é o que surpreende nesse exercício, é o novo, o que supõe invenção, criatividade, astúcia. É certo, também, que, dependendo da forma como é proposto, o exercício pode configurar um problema.
Seria, então, possível perguntar se as questões são formas de exercício ou de problema. Certas questões sugerem bons problemas, outras não. O importante é que a questão faça gerar um desejo ou uma necessidade que só o trabalho de encontrar uma solução possa satisfazer. É fundamental, ainda, que a questão proponha um desafio que possa proporcionar ao sujeito que o experimenta algo no mínimo original, criativo ou surpreendente. Convenhamos, na escola nem sempre sabemos fazer isso.
Um problema supõe um projeto mais complexo, que envolve interpretação da questão proposta, planejamento, execução e avaliação. Envolve também atenção, malícia, espírito crítico e reflexão.

Competências e Habilidades
Por que decidi, em um texto sobre competências e habilidades, iniciar comentando sobre solução de problemas? Para responder a essa questão talvez valha a pena mais uma pequena digressão.
Até pouco tempo, a grande questão escolar era a aprendizagem – exclusiva ou preferencial – de conceitos. Hoje, essa forma de competência continua sendo valorizada, principalmente, no meio universitário. Mas, com todas as transformações tecnológicas, sociais e culturais, uma questão prática, relacional, começa a impor-se com grande evidência. Temos muitos problemas a resolver, muitas decisões a tomar, muitos procedimentos a aprender. Isso não significa, obviamente, que dominar conceitos deixou de ser importante. Esse tipo de aula, insisto, continua tendo um lugar, mas cada vez mais torna-se necessário também o domínio de um conteúdo chamado de “procedimental”, ou seja, da ordem do “saber como fazer”.

As três formas de competência
Passemos agora ao objetivo principal desse texto: fornecer elementos para uma reflexão pedagógica sobre significados de “competências e habilidades”.
Proponho que competência seja entendida de três modos, muito interessantes e comuns.
Competência como condição prévia do sujeito, herdada ou adquirida. Essa primeira forma de competência não significa apenas formas de aquisição, mas também pode se referir a uma perda - permanente ou transitória - de competência.
Competência como condição do objeto, independente do sujeito que o utiliza. Na escola, essa forma de competência está presente, por exemplo, quando julgamos um professor pela ‘competência’ do livro que adota, da escola em que leciona, do bairro onde mora.
Competência relacional. Essa terceira forma de competência é interdependente, ou seja, não basta ser muito entendido em uma matéria, não basta possuir objetos potentes e adequados, pois o importante aqui é “como esses fatores interagem”. A competência relacional expressa esse jogo de interações.
As três formas de competência, acima descritas, na prática não se anulam necessariamente, pois se referem a dimensões diferentes e complementares de uma mesma realidade.

Competência e habilidade
A diferença entre competência e habilidade, em uma primeira aproximação, depende do recorte. Resolver problemas, por exemplo, é uma competência que supõe o domínio de várias habilidades. Calcular, ler, interpretar, tomar decisões, responder por escrito, etc., são exemplos de habilidades requeridas para a solução de problemas de aritmética. Mas, se saímos do contexto de problema e se consideramos a complexidade envolvida no desenvolvimento de cada uma dessas habilidades, podemos valorizá-las como competências que, por sua vez, requerem outras tantas habilidades.
Para dizer de um outro modo, a competência é uma habilidade de ordem geral, enquanto a habilidade é uma competência de ordem particular, específica.
Na visão relacional de competência aqui proposta, se os alunos não aprenderam é porque o professor não ensinou, independentemente de sua competência pessoal no domínio dos conteúdos e do valor, de verdade, de sua exposição.

Competição, competência e concorrência
Como analisar os termos competência, competição e concorrência, em uma perspectiva relacional?
Competição. Competir quer dizer “com-petir”, isto é, “pedir junto”. O prefixo “com” significa ao mesmo tempo, simultaneamente. O radical “petir” significa pedir. Numa sala de aula, por exemplo, alunos, diretora, orientadora, horário, agenda de trabalho referem-se às múltiplas tarefas de que a professora deve cuidar – de preferência, ao mesmo tempo. Então, ao que dar prioridade; que decisões tomar?
Concorrência. Concorrer quer dizer correr junto “dirigir-se para o mesmo ponto”. Como cuidar, “simultaneamente”, (porque tudo é importante, esperado, desejado) da vida pessoal, profissional, familiar, etc.? Ou seja, em termos de concorrência, não se trata de optar ou conquistar um aspecto em detrimento de outros (como ocorre na situação de competição), mas de responder adequadamente à multiplicidade das tarefas, de atender a tudo, pois tudo tem de ser atendido. É o caso, por exemplo, da situação de sala de aula.
Competência. Como coordenar competição com concorrência? Com competência. Competência, em sua perspectiva relacional, é uma equação que expressa o equilíbrio entre dois opostos complementares. A competição como fim buscado (necessidade), e a concorrência como repertório (disponibilidade) de coisas independentes quanto a um fim particular, mas que, na perspectiva do sujeito, qualificam os meios de certa realização.
Competência é a qualidade relacional de coordenar a multiplicidade (concorrência) à unicidade (competição).

Aprendizagem significativa e competência relacional
Outro termo presente nas orientações didáticas é a “aprendizagem significativa”.
A aprendizagem significativa instaura novamente na escola uma condição fundamental de nossa busca de conhecimento. Essa condição é a do desejo, ou seja, do conhecimento como necessidade, algo que “falta ser”, que ainda não é nos termos pretendidos ou aceitos pelo sujeito.
A aprendizagem significativa supõe que se encontre “eco” no sujeito a quem é proposta. Daí sua vinculação com uma forma relacional de competência.










A situação-problema como avaliação e como aprendizagem[2]
Lino de Macedo

Mobilizar recursos
Uma das características importantes da noção de competência, segundo Perrenoud, é desafiar o sujeito a mobilizar os recursos no contexto de situação-problema para tomar decisões favoráveis ao seu objetivo ou metas.
Uma situação-problema, em um contexto de avaliação, define-se por uma questão que coloca um problema, ou seja, faz uma pergunta e oferece alternativas, das quais apenas uma corresponde ao que é certo quanto ao que foi enunciado. Os indicadores correspondem, portanto, ao conjunto de sinais, marcas, informações, aspectos destacáveis no texto do enunciado e, igualmente, ao conjunto de pensamentos, idéias, representações, lembranças, raciocínios, sentimentos, etc. do sujeito que está respondendo à questão. Esses indicadores relativos ao objeto, que o sujeito pode observar, e os indicadores relativos ao próprio sujeito, juntos, produzem os elementos, cujo julgamento permitirá a tomada de decisão sobre o que está sendo perguntado e as alternativas disponíveis, das quais apenas uma delas é a correta.
Inferência é o que possibilita a conclusão ou tomada de decisão, em um contexto de julgamentos, raciocínios, interpretação de informações, em favor de uma das alternativas propostas.
Uma boa questão deve propor um percurso entre uma situação de partida, que corresponde à proposição do enunciado, até um ponto de chegada, que corresponde à escolha da alternativa, suposta pelo avaliado, como a que melhor representa a resposta correta.
As situações-problema propõem uma tarefa para a qual o sujeito deve mobilizar seus recursos ou esquemas e tomar decisões.
A competência mais importante para nós é, sem dúvida, a relacional, até porque ela expressa a dimensão indissociável e interdependente das competências relativas ao sujeito e ao objeto. Relacional em suas três versões ou possibilidades de expressão. Há uma relação interpessoal que solicita o desenvolvimento de competências transversais muito importantes. A segunda forma de competência relacional é a relativa aos objetos. Temos destruído a natureza, intoxicado os rios, a atmosfera, depredado bens públicos, maltratado nossos corpos e abandonado regras e princípios que a humanidade e a natureza levaram séculos e séculos para construírem. A terceira forma de competência relacional diz respeito às tarefas ou ao trabalho humano diante das pessoas e dos objetos.
Essas considerações são importantes porque se pode fazer uma questão na perspectiva do modo como as máquinas funcionam e não no modo como as pessoas funcionam ou que se espera que elas funcionem. Por isso, para avaliar se uma situação-problema é boa ou não, temos que julgar se a questão pede solução de problemas, na perspectiva das pessoas ou das máquinas.
ma boa situação-problema, como técnica de avaliação e como concepção de aprendizagem, portanto, deve compor um sistema, ao mesmo tempo, fechado (como um ciclo) e aberto. Fechado como ciclo no sentido de que convida o aluno a percorrer o seguinte percurso no contexto de cada questão: 1) alteração, 2) perturbação, 3) regulação e 4) tomada de decisão (ou formas de compensação). Aberto, no sentido de que propõe trocas ou elementos de reflexão que transcendem os limites da prova e ilustram, ainda que como fragmentos ou lampejos, algo que será sempre maior e mais importante do que as circunstâncias de uma prova, com todos os seus limites e com toda a precariedade de sua realização.

Alteração
A situação-problema,por seu enunciado, cria um contexto que formula uma alteração a ser examinada pelo aluno. Por ser artificial, a situação-problema simula, recorre, inventa ou cria contextos que favorecem a avaliação ou o julgamento de uma dada questão.
Diante de uma alteração, mesmo que artificialmente produzida, podemos ter duas classes de reações. Uma delas expressa-se pela indiferença ou divagação (que impede a compreensão do problema como problema). A segunda classe de reação a uma alteração refere-se à perturbação ou solução ou neutralização do que foi alterado. No contexto de nossas considerações, só interessa a situação-problema que produz uma alteração e que convida o sujeito a reagir ou agir em face da alteração.

Perturbação
Uma perturbação expressa o fato de que uma alteração foi assimilada como um problema, pois, caso contrário, seria suficiente dar a resposta. A perturbação produz um desequilíbrio, rompe com a harmonia do que o sujeito sabia ou pensava sobre um determinado assunto.
Os graus de perturbação oscilam entre um máximo e um mínimo.
Uma boa situação-problema representa, por seu enunciado, a criação de uma perturbação, que altera algo no sujeito e que possibilita, ao propor o conjunto das alternativas, a oportunidade de fechamento do ciclo aberto pelo enunciado.
O que fazemos diante de uma perturbação? A primeira reação refere-se a uma forma negativa de reação. O sujeito desiste, irrita-se, sente-se desqualificado para coordenar as informações ou para aproveitar os indicadores ou dicas oferecidas tanto no enunciado quanto nas alternativas de respostas. Ou seja, a perturbação não gera um trabalho de conhecimento, nem a busca de uma melhor solução. Na segunda classe de reação à perturbação, observamos um trabalho de regulação. Uma boa avaliação deve conter questões ou problemas que mobilizem esse tipo de reação às perturbações. Ou seja, as alternativas apresentadas, em princípio, expressam diferentes soluções ou modos de se compensar uma perturbação, sendo apenas uma delas a que se configura como a melhor solução, nos termos da situação-problema ou tarefa.

Regulação
Regulação é o que fazemos para recuperar o equilíbrio rompido pela pergunta ou problema proposto. Escolher, pelo trabalho da reflexão e de tomada de decisão, a melhor alternativa para uma questão significa realizar uma compensação perfeita, pois recupera o ciclo rompido pela perturbação provocada pela questão.

Como sabemos, a prova é elaborada em um contexto em que os itens são montados em um formato de múltipla escolha. O enunciado identifica o problema. Há uma lista de cinco alternativas, das quais apenas uma é correta (distratora). Nesse sentido, eu diria que das cinco alternativas de resposta algumas têm relação apenas “contingencial” ao enunciado. Contingencial, pois, ainda que as respostas possam, em si mesmas, ser verdadeiras, não se aplicam ao contexto do problema, como formulado em seu enunciado. Portanto, as respostas têm, nesse caso, uma relação aleatória com o enunciado, tal como proposto. Outras respostas são “possíveis, mas não suficientes”, ou seja, propõem como solução algo que não preenche todas as necessidades que permitem eliminar o problema (resolução).
Por isso, há apenas uma única resposta “possível, necessária e suficiente”, pois é a única que integra, que compensa, ou equilibra a perturbação criada com a proposição.


[1] INEP. ENEM: Fundamentação Teórico-Metodológica. Brasília: O Instituto, 2005.
[2] INEP. ENEM: Fundamentação Teórico-Metodológica. Brasília: O Instituto, 2005.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011


TÓPICO VI – VARIAÇÃO LINGÜÍSTICA

Matriz de Língua Portuguesa de 8ª série
Comentários sobre os Tópicos e Descritores
Exemplos de itens
TÓPICO VI – VARIAÇÃO LINGÜÍSTICA
Este tópico refere-se às inúmeras manifestações e possibilidades da fala. No domínio do lar, as pessoas exercem papéis sociais de pai, mãe, filho, avó, tio. Quando observamos um diálogo entre mãe e filho, por exemplo, verificamos características lingüísticas que marcam ambos os papéis. As diferenças mais marcantes são intergeracionais (geração mais velha/geração mais nova).
O estudo da variação lingüística é, também, essencial para a conscientização lingüística do aluno, permitindo que ele construa uma postura não-preconceituosa em relação a usos lingüísticos distintos dos seus.É muito importante mostrarmos ao aluno as razões dos diferentes usos, quando é utilizada a linguagem formal, a informal, a técnica ou as linguagens relacionadas aos falantes, como por exemplo, a linguagem dos adolescentes, das pessoas mais velhas.É necessário transmitirmos ao aluno a noção do valor social que é atribuído aessas variações, sem, no entanto, permitir que ele desvalorize sua realidade ou a deoutrem. Essa discussão é fundamental nesse contexto.
D13 – Identificar as marcas lingüísticas que evidenciam o locutor e o interlocutor de um texto.
Por meio deste descritor pode-se avaliar a habilidade do aluno em identificar quem fala no texto e a quem ele se destina, essencialmente, por meio da presença de marcas lingüísticas (o tipo de vocabulário, o assunto, etc.), evidenciando, também, a importância do domínio das variações lingüísticas que estão presentes na nossa sociedade.
Essa habilidade é avaliada em textos nos quais o aluno é solicitado a identificar,o locutor e o interlocutor do texto nos diversos domínios sociais, como também são exploradas as possíveis variações da fala: linguagem rural, urbana, formal, informal, incluindo também as linguagens relacionadas a determinados domínio sociais, como, por exemplo, cerimônias religiosas, escola, clube, etc.
Exemplo de item do descritor D13: Pressa
Só tenho tempo pras manchetes
no metrô
E o que acontece na novela
Alguém me conta no corredor
Escolho os filmes que eu não
vejo
no elevador
Pelas estrelas que eu encontro
na crítica do leitor
Eu tenho pressa e tanta coisa me interessa
Mas nada tanto assim
Eu me concentro em apostilas
coisa tão normal
Leio os roteiros de viagem
enquanto rola o comercial
Conheço quase o mundo inteiro
por cartão-postal
Eu sei de quase tudo um pouco
e quase tudo mal
Eu tenho pressa e tanta coisa me interessa
mas nada tanto assim
Bruno & Leoni Fortunato. Greatest Hits’80. WEA.
Identifica-se termo da linguagem informal em
(A) “Leio os roteiros de viagem enquanto rola o comercial.” (v. 14-15)
(B) “Conheço quase o mundo inteiro por cartão postal!” (v. 16-17)
(C) “Eu sei de quase tudo um pouco e quase tudo mal.” (v. 18-19)
(D) “Eu tenho pressa e tanta coisa me interessa mas nada tanto assim.” (v. 20-21)

Nossa escola julho 2011






Festa Julhina










Nossa escola







Modelo Simple. Tecnologia do Blogger.

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